Correnteza # Janeiro/2025
livros, jogos, filmes, podcasts, quadrinhos e notas aleatórias que rolaram no mês
Nesse mês, uma edição menor do que o normal que traz:
um texto sobre tradutores e intérpretes na Revista FAPESP;
mais algumas leituras de janeiro, com direito a muitos quadrinhos;
filmes que vi na corrida pro Oscar & algumas animações;
algumas decisões curiosas;
e os livros que chegaram por aqui.
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1.
No final do ano passado, fui convidado pela revista Pesquisa FAPESP para escrever uma matéria sobre tradutores e intérpretes. Foi um processo bastante curioso, feito na junção da experiência de jornalista & de pesquisador, para discorrer sobre as pesquisas desenvolvidas no campo a partir de alguns pesquisadores e grupos de pesquisa (principalmente na área de Literatura Russa, um xodó meu).
Mas queria citar duas observações que me deixaram bastante reflexivo sobre o processo tradutório e que, infelizmente, não couberam na matéria. A primeira delas parte da professora e tradutora Luciana Carvalho Fonseca, que integra o coletivo Sycorax e leciona no Departamento de Letras Modernas da Universidade de São Paulo (USP), sobre a tradução enquanto processo pedagógico.
Em uma parte da conversa, Fonseca fala sobre a disseminação de um discurso neoliberal que instrumentaliza a educação para um fim prático: para conseguir emprego e produzir riquezas. Mas é possível ver “a educação como um caminho para aprender a dar e fazer sentido das coisas”. Nesse processo, quanto mais sentidos você consegue perceber, mais educado você está. É perceber que tudo é mais complexo do que parece à primeira vista. Tanto que “o que o discursos conservadores fazem é privar as pessoas de sentido. O tempo inteiro”.
A tradução, por outro lado, “age contra isso, porque, quem traduz, sabe que um poema nunca tem um sentido só, que há uma tradução, mas que poderiam ter outras dez produzidas pela mesma pessoas”. Ampliar o sentido é uma percepção que o conhecimento linguístico traz e, por isso, Fonseca pensa que ela não faz tradução, mas vive o processo tradutório.
Por fim, outro momento que evidenciou essa presença da multiplicidade de sentidos como um fluxo importante surgiu da conversa com Walter Costa, professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). De acordo com Costa, conseguimos ver como os momentos de transformações culturais estão sempre conectadas ao fluxo de ideias — e, é claro, das traduções desses pensamentos que vão circular e ultrapassar barreiras linguísticas. Sem o processo tradutório, por exemplo, não teríamos grande parte dos pensamentos religiosos.
Hibridismo e simbiose são constantes na vida, do corpo à linguagem. A contaminação é uma coisa belíssima. E quem quiser conferir as outras questões que foram apontadas no texto pode conferir a matéria Trajetórias de tradutores e intérpretes saem dos bastidores, publicada em janeiro na revista Pesquisa FAPESP.
2.
No âmbito das leituras… Em janeiro, li:
Serpentário, de Felipe Castilho. Finalista do 62º Jabuti na categoria Romance de Entretenimento, o livro conta a história de Caroline, Mariana e Hélio, amigos de família abastada que iam para as suas respectivas casas de praia e curtiam o tempo livre junto com Paulo, um jovem caiçara que morava na região. Mas, durante as férias de fim de ano de 1999, o Réveillon sai do controle. Enquanto terremotos afetam a região, cachorros desaparecem e famílias discutem, seguir as figuras misteriosas até a misteriosa Ilha das Cobras — uma ilha que, com certeza, não estava ali antes — pode não ser a ideia mais brilhante da turminha e vai gerar escolhas e sacrifícios com consequências complexas.
Castilho reúne muitos elementos da tradição do horror cósmico, inclusive com referências ao Rei de Amarelo e Carcosa, mas faz uma crítica da herança supremacista que o gênero carrega consigo — ao mesmo tempo que aponta a onda de conservadorismo na sociedade brasileira. Gosto das imagens que ele usa, da forma com que mescla diferentes linhas do tempo e experimenta com a linguagem em capítulos intermediários e da conclusão que escapa de uma vingança fácil ou do revanchismo.Guerra da papoula, de R.F. Kuang. Esse é o primeiro livro de uma trilogia de fantasia que reconta parte dos eventos históricos do conflito entre a China e o Japão enquanto acompanhamos a história de Rei, uma menina pobre do interior rural que passa em uma das provas mais difíceis do país para entrar em um colégio de elite. No entanto, durante seus anos de formação, a tensão bélica entre duas potências se intensifica e a guerra entre as regiões começa.
Em resumo, tive a impressão de ser um livro um tanto inchado, apesar de Kuang escrever muito bem e manter a leitura fluída. Há o mérito de mostrar conflitos que não giram ao redor de guerras europeias, mas, em diversos momentos, cenas brutais de violência sexual e genocídio são usadas como artifícios para gerar a sensação de choque — algo que destoa da proposta que, justamente, deveria mostrar os causos horrendos dos conflitos históricos. No entanto, é um livro interessante, o primeiro romance escrito por R.F. Kuang e pretendo ler A impostora e Babel. Quem quiser saber mais sobre o livro, pode conferir o episódio que gravamos no 30:MIN, 517: ‘A Guerra da Papoula’, de R.F. Kuang, merece o prêmio?.Oração para desaparecer, de Socorro Acioli. O livro foi escolhido como a leitura do mês de janeiro no Clube de Leitura 30:MIN de 2025 e conta a história de uma mulher que renasce em Almofala, um pequeno vilarejo de Portugal, sem lembrar de sua vida pregressa ou dos motivos de seu corpo estar repleto de machucados e hematomas. No entanto, quando desabrocha seu romance com um dos homens que encontra na família que a acolhe, ela precisa criar um passado para si e compartilhar o pouco que lembrou enquanto sonhava.
É uma obra bastante bonita e versa sobre memória, identidade e a constituição humana a partir do olhar do outro. Escrito em três partes, o livro é constituído todo por meio de diálogos e Socorro parte de um acontecimento real para estabelecer a trama do livro: o soterramento de uma igreja no Ceará por dunas de areia e os conflitos político envolvendo a população dos Tremembés na região.
Já temos a live gravada no YouTube, mas também é o episódio que sai nessa sexta-feira e vocês podem esperar a publicação. Para quem quiser conhecer mais sobre o caso da igreja soterrada, tem um documentário bastante interessante sobre a região chamado Bailado de vozes e ventos em Almofala e algumas matérias sobre a duna saíram na imprensa. Há também uma entrevista com um pesquisador do Ceará que explica o fenômeno das dunas.Eventos apocalípticos: Eduardo e Afonso, de Yoshi Itice. Eduardo é um jovem repleto de boas intenções, tímido e faz tudo para seu irmão Afonso. O único problema é que Afonso é uma secadora desbocada e que parece fazer questão de ser desagradável… além de esquecer que ambos só estão se aventurando porque Eduardo quer encontrar uma forma de desfazer a maldição de Afonso.
Gosto muito da série de livros dos Eventos apocalípticos. Acho as histórias divertidas, com bons momentos de reflexão. Li tudo quando ele começou a publicar no Instagram. Apoiei a campanha para receber os PDFs e, agora, estou feliz de ver uma nova edição com pequenas mudanças, materiais extras e impresso. Ansioso para as próximas edições — principalmente, para ver novamente o Gilmar.
Outras leituras: continuando o caminho de histórias clássicas do Lanterna Verde Hal Jordan, li a coleção dos anos 1970 Green Lantern & Green Arrow, de Dennis O'Neil e Neal Adams. É uma coletânea curiosa, mas que não curti tanto. Também li os dois primeiros volumes de Hell’s Paradise, de Yuji Kaku, e gostei das imagens híbridas da natureza contaminada e das criaturas da ilha paradisíaca, mas a história ainda não me conquistou. Continuei a leitura de Lobo solitário nos volumes #5 e #6 e retomei a leitura de Ultimate Spider-Man, do #2 ao #6 volume. Também li o quadrinho da Bruna Maia Parece que piorou, uma coletânea bastante interessante com críticas atuais e que vocês logo poderão conferir no 30:MIN.
3.
Só consegui terminar a primeira temporada de Dandadan agora, no começo de janeiro, mas estava interessado pela esquisitice e bizarrice da série desde o fim do ano passado, quis ler o mangá e escutei a abertura incontáveis vezes. Para quem não conhece, acompanhamos a vida de Ken Takakura, um menino sem amigos que é fascinado por histórias de OVNIs, que se aproxima de Momo Ayase, neta de uma conhecida médium do Japão. Como é de se imaginar, Ken não acredita em espíritos e Momo, em ETs.
Por isso, os dois batem uma aposta: na madrugada, cada um vai se dirigir para locais com picos de atividade estranha e conferir se estão certos ou errados. Claro que tudo dá errado: Momo é abduzida por uma raça de alienígena só de homens que procura mulheres para procriar e Ken é possuído pela Vovó Turbo e tem sua genitália roubada. Achei a história bastante interessante, não só pela ação que esse gênero de história geralmente tem, mas porque conta a história desse casal adolescente, aos poucos, vai descobrindo que estão apaixonados.
Além disso, revi a primeira temporada de Ruptura para acompanhar a segunda com as coisas mais frescas na memória. Já escrevi sobre a série aqui na Ponto Nemo e a relação com o capitalismo tardio, para quem quiser conferir. Fui rever Interstelar no cinema e é muito curioso como é um filme com propostas muito boas — e algumas até muito bem executadas — mas que derrapa em diversos pontos, como na construção das personagens femininas e como isso se relaciona na questão racionalidade versus sensibilidade. Enfim.
Também começou a temporada de filmes do Oscar. Nosferatu é um bom filme, pouco propositivo em relação ao que já foi dito sobre a história, com cenas muito bonitas, mas que me pareceu receber uma atenção superestimada. Conclave também tem cenas belíssimas e um elenco que atua muito bem, mas um roteiro que não conseguiu me atingir (como disse um amigo, é um pouco de filme para pais e católicos, que vão se envolver com o dilema apontado no filme). Por fim, fui assistir Emilia Perez de coração aberto, sem clubismo, mas é realmente ruim. Me parece insuficiente em todas as propostas que faz, desde a parte musical até o roteiro e as construções visuais.
4.
Tenho usado janeiro para reorganizar meu tempo livre. Voltei a fazer atividades físicas regulares, consegui assistir a mais filmes e séries, mantive minha rotina de leitura… mas ainda falta a escrita e organização para achar um tempo para jogar. Vamos aos poucos.
Nesse meio tempo, também organizei um plano de estudos e fiz uma resolução de, além de estudar russo, aprender japonês. Não sei muito bem como isso vai acontecer, mas deixo escrito aqui para jogar para o mundo e ver se funciona. É para manter o ritmo. No mais, seguimos por aqui.
5.
Em janeiro, a editora HarperCollins enviou também o lançamento Erupção, escrito por Michael Crichton e James Patterson.
Obrigado por ler até aqui!
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Outras produções estão disponíveis no meu site pessoal e você pode me ouvir falando de literatura no podcast 30:MIN.
Se quiser conversar, pode responder esse e-mail ou me encontrar no Instagram.
No último mês, eu:
Participei do episódio: “30:MIN 513: Flores para Algernon, de Daniel Keyes (com Luisa Geisler)”;
Participei do episódio: “30:MIN 514: Livros para ler em 2025”;
Participei do episódio: “30:MIN Entrevista: Aline Valek” (com
, escritora de );Participei do episódio: “30:MIN 515: Autores que mais nos decepcionaram”;
Participei do episódio: “30:MIN 516: Por que ler best-sellers?”;
Participei do episódio: “30:MIN 517: ‘A Guerra da Papoula’, de R.F. Kuang, merece o prêmio?”.
Não sabia que Oração pra desaparecer tinha aproveitado um fato real, muito foda! Serpentario eu gostei bem quando li, mesmo sendo meio cagão pra terror hauhauhauhauah li no lançamento até, preciso mesmo é ler Ordem vermelha 2.
Sobre a rotina de exercícios isso é uma vitória massa, mano! Espero que tu continue firme. Agora sobre conseguir fazer esse caralhal de coisa aí boa sorte, eu já desisti de jogar ou asssstir filme, da pra mim não hahaha
E boa sorte na aprendizagem das línguas! Essas duas eu queria muito quando era moleque, mas hoje em dia travei no espanhol e acho que nem falo mais inglês.